domingo, 26 de junho de 2011

Desde que embasado por laudo, tratamento pode ser involuntário




De: Reynaldo Mapelli Júnior – Especial Para a Folha De São Paulo

A população em situação de rua, hoje disseminada por quase todo o Estado, representa um dos maiores desafios aos gestores públicos.
 

Em geral, tais pessoas encontram-se em situação de vulnerabilidade extrema e têm pouca capacidade de articulação. Há tempos, sabe-se que uma parcela significativa delas padece de transtornos mentais, inclusive dependência de drogas como álcool e crack, consumindo-os em plena luz do dia, muitas vezes acompanhadas de outras pessoas em lugares vulgarmente chamados de “cracolândias”.

Dependentes de drogas padecem de sofrimento psíquico e têm direito ao “acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades” (Lei 10216/ 2001, art. 2º, p. único, II); como “saúde é direito de todos e dever do Estado” (art. 196 da Constituição Federal), o SUS deve lhes garantir diferentes modalidades de tratamento e recuperação, com ênfase em serviços extra-hospitalares como moradias assistidas e tratamento ambulatorial.
Não há dúvida de que, em um Estado Democrático de Direito, o princípio da dignidade humana e todos os atributos que compõem a cidadania (art. 5º, incisos II e III, da Constituição) impedem o poder público de restringir indevidamente a liberdade das pessoas.
 

Desde que embasada em laudo médico, no entanto, é perfeitamente possível a internação psiquiátrica sem o consentimento destas pessoas (involuntária ou por ordem de juiz; art. 6º da lei citada), para tratamento, reabilitação e reinserção social.

REYNALDO MAPELLI JÚNIOR é promotor e coordenador da área de saúde pública do Ministério Público de São Paulo
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Kassab quer tirar à força viciado das ruas
Prefeitura de SP procura consenso jurídico para adotar a medida; alvo principal serão usuários da cracolândia
Para secretário, é preciso encontrar um equilíbrio entre a dignidade humana e o direito de ir e vir- Folha de São Paulo – EVANDRO SPINELLI DE SÃO PAULO

A Prefeitura de São Paulo quer retirar das ruas, à força se for preciso, usuários de drogas que recusem tratamento. A administração já busca uma alternativa jurídica para isso.


O prefeito Gilberto Kassab (PSD) disse ontem, durante a sabatina Folha/UOL, que a ideia é “dar mais liberdade” para as equipes de saúde e de assistência social da prefeitura poderem atuar com usuários de drogas. O alvo principal é a cracolândia.


Cláudio Lembo, secretário de Negócios Jurídicos e ex-governador, disse que está conversando com o TJ (Tribunal de Justiça), o Ministério Público e a Defensoria Pública sobre o assunto. Lembo pretende criar um “consenso jurídico” para embasar as ações da prefeitura.
A Defensoria negou que esteja participando das discussões. O TJ não confirmou estar participando da discussão e o Ministério Público não respondeu.


Segundo Lembo, o principal argumento de quem é contrário à medida é que o direito à locomoção, ou “direito de ir e vir”, não permite a retirada compulsória de pessoas das ruas.“Mas também existe o direito à dignidade humana e à integridade física. Precisamos achar um equilíbrio.”Lembo afirmou, no entanto, que as discussões ainda são iniciais e não há data para serem concluídas.


No próprio governo Kassab há divergências sobre o assunto. Por isso, o trabalho de Lembo é buscar um consenso jurídico antes de ser tomada uma decisão.O modelo que a prefeitura pretende usar é o adotado no Rio, mas incluindo adultos.Carlos Weis, coordenador do núcleo de direitos humanos da Defensoria Pública, defende o debate “franco e aberto”, mas diz que a retirada compulsória de pessoas das ruas é inconstitucional

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