terça-feira, 22 de novembro de 2011

De repente, 46 milhões- por: Jairo Marques



São milhões de pessoas que podem eleger um candidato, mas que têm dificuldades para chegar até a urna
ATÉ A semana passada, o Brasil não sabia ao certo quantas eram as pessoas cuja funilaria motora, intelectual ou sensorial possuía alguma avaria. Agora, o Censo 2010 revela que dá para lotar uma quitanda de gente que não vê direito, que não para em pé com as próprias pernas, que tem o escutador de novela prejudicado, que é meio trelelé das ideias, que está fora da curva do tal padrão "normal".
São cerca de 46 milhões de brasileiros -23,9% do total- que declaram ter algum nível de deficiência física, dos sentidos ou da cachola. Para se ter uma ideia do tamanho do papagaio, a população da Espanha é de cerca de 50 milhões de habitantes.
A partir disso, penso que "difinitivamente", como diria minha tia Filinha, ninguém vai poder dizer que não promove ou defende a acessibilidade e a inclusão porque não conhece alguém que precise de condições diferenciadas para ir, vir, ficar, fazer e interagir.
Os pesquisadores também chegaram ao número de pessoas que afirmam ter alguma deficiência severa, ou seja, aquelas que dão um "trabaaaalho" lascado, "catigoria" na qual me incluo, contrariando as comissárias de bordo, que sempre perguntam se não ando "só um pouquinho". São 6,7% dos nativos, 12,7 milhões de viventes.
Dos "extremamente arruinados", a maioria são pessoas que se declaram cegas ou quase cegas, 3,5% do todo. Fiquei surpreso com esse apontamento, pois os esforços de acessibilidade são mais focados em barreiras arquitetônicas enfrentadas por deficientes motores.
Mas, como o sabido José Saramago já havia anunciado no angustiante "Ensaio sobre a Cegueira", talvez todos nós tenhamos dificuldade de ver a própria realidade. O negócio então é acelerar a produção de livros em braile, a distribuição de programas que fazem leitura de telas de computador, dos pisos com sinalização tátil nas calçadas, do treinamento dos cães-guia que ajudam para dedéu.
É a primeira vez na história do país que se revela um retrato tão detalhado desse público. No levantamento de 2000, o IBGE fez uma estimativa de 14% dos brasileiros que conviviam com algum tipo de deficiência, mas as perguntas não foram tão objetivas. Tanto que não há como comparar com segurança as informações entre as décadas.
Os números são importantes porque descortinam verdades: são milhões de bocas para comer em restaurante sem cardápio em braile; milhões de eleitores que podem levar um candidato ao trono, mas que têm um caminhão de dificuldades para chegar até a urna; milhões de crianças mal-acabadinhas que precisam de escolas que as aceitem com profissionalismo; milhões de pessoas que são mão de obra legítima para ser peão ou ser da diretoria.
Ter um quarto dos brasileiros com algum desarranjo no esqueleto ou no software é também motivo de ligar o alerta vermelho para situações sociais que seguem prejudicando vidas e fazendo brotar paraplégicos, tetraplégicos...
Há mais gente se lascando em acidentes de trânsito -jovens principalmente-, a violência segue deixando rastros em famílias, muita gente está envelhecendo sem atenção básica e os cuidados com a saúde de gestantes e bebês precisam avançar mais.
http://www1.folha.uol.com.br

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